quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

As férias, e a reflexão.

Oi, gente. Estou de férias né... e ando muito reflexiva nesses últimos tempos. Escrever é uma coisa que me faz colocar os pensamentos em ordem, tipo uma terapia. Eu escrevo, eu releio, eu penso sobre aquilo. Eu deixo salvo em uma pasta perdida no computador, e esqueço. Aí um belo dia, encontro de novo, leio mais uma vez, e vejo tudo de outra perspectiva. Ou não... as vezes só dou uma cutucada nas velhas feridas mesmo. Sabe quando a gente tem um machucado sangrando, e quando ele finalmente começa a querer curar a gente vai lá e arranca a casquinha? É uma boa metáfora. 
Bom, nem tudo que eu escrevo vem parar no blog, e não é como se fosse um diário, são só pensamentos. Pois bem, mas acredito que por esses dias vocês vão acabar me vendo com uma frequência maior por aqui. Eu acho. 

O último ano foi complicado, né? Cheio de extremos e coisas inesperadas, altos e baixos... mas acho que isso é o que dá emoção pra vida, sei lá, faz a gente se sentir vivo. O objetivo desse post não é fazer um balanço de como foi o ano nem nada, nem passar uma mensagem bonitinha de superação e desejos para o próximo ano. Não é isso. Aliás eu não estou com cabeça nenhuma pra fazer isso, porque na real eu preciso é organizar a minha vida.

Esse ano eu vivi pra universidade, e isso não é de todo ruim... tirando o fato de que eu esqueci de mim mesma. Me larguei totalmente. Antes, eu vinha numa fase bem legal de amor próprio e cuidado comigo mesma. Auto-estima estava legal, eu tava conseguindo ser um pouco independente, tava prestando atenção em mim, indo pra academia todo dia, feliz, endorfinas e etc... feliz em me olhar no espelho, em usar uma roupa nova, ajeitar o cabelo, usar uma maquiagem diferente... 

Daí veio a reviravolta na vida. Me adaptar em uma cidade diferente foi ok... eu conheço pouca coisa da cidade, visto que minha rotina se baseia em ir de casa pra universidade e vice versa, todos os dias. No máximo uma caminhada pelo bairro, uma ida até o centro, umas voltas na redenção e olhe lá. 

Me adaptar em uma casa que não é a minha, em uma cama improvisada que não é a minha, consciente de que aquele espaço é emprestado e não me pertence, não foi tão ok. Passei o ano me anulando de todas as formas para não incomodar. Sem reclamar. Sem fazer barulho. "Foca no que tu veio fazer aqui". "Ignora o barulho e te concentra, faz as tuas coisas". "O principal aqui é estudar, não fica de mimimi!". "Não esquece que tem que ir no mercado, tem que lavar a roupa, tem que tirar a roupa seca da corda e guardar, tem que fazer comida pra amanhã, não deixa nada sujo na cozinha. Tem que recarregar o vale transporte, tem que sacar o dinheiro das contas desse mês, tem que manter tudo organizado, tu não pode ser um empecilho aqui, tu não tem pra onde ir". Isso em meio à pressão psicológica das milhões de provas, e trabalhos, e de tentar ser suficientemente boa o bastante para não repetir matérias na universidade, pra não ter que alongar ainda mais a minha estadia.

Não é como se eu não tivesse que ter responsabilidades também, se morasse sozinha. Ou se pelo menos dividisse o aluguel, tivesse um quarto, uma porta pra fechar e poder ficar sozinha de vez em quando. Eu ainda teria que ter todas essas ~responsabilidades de adulto~, porque elas fazem parte da minha vida, agora. Mas não é isso que me incomoda. Não é o cansaço de ter coisas pra fazer. É a constante sensação de que eu estou sendo um empecilho, sabe? De que nada daquilo me pertence, e eu só preciso abaixar a cabeça e aprender a conviver, mesmo que algo me desagrade.Também não é como se eu fosse mal agradecida, e estivesse reclamando. Eu sou grata por poder usufruir de algum espaço, e por causa disso ter a possibilidade de seguir estudando. 

O fato é que ao longo do ano, toda aquela onda de amor próprio e cuidado comigo mesma... desapareceu. Seja pelo motivo que for... sumiu. Como agora eu vivo de bolsa, e a grana é beeeeeeeeem limitada, desisti de procurar uma academia. E passei a me alimentar super mal, também. Seja pela preguiça + falta de habilidade de cozinhar algo mais elaborado todos os dias... seja pela grana curta, que só deixa comprar o essencial no supermercado. Digamos que esse ano eu comi mais miojos do que nos últimos 5. E pizzas congeladas. Várias. Não preciso nem dizer que engordei, né? Mas foda-se... é só usar roupas mais largas. "Foca no que tu veio fazer aqui, vai estudar. O resto não importa."

Desisti de manter o meu cabelo bonito. Ele era enorme, mas estava um bagaço. Cortei na altura do ombro. Preciso dizer... eu gostei. Dá muito menos trabalho! E aproveitei pra doar o pedação que saiu, pro hospital da criança, na Santa Casa. Eles fazem perucas com os cabelos doados!


 Mas daí eu desisti de pintar, também. E ele foi ficando cada vez mais opaco e desbotado. E a raiz, crescendo e deixando aparecer vários fios brancos que até não muito tempo, não existiam. "Isso não importa também. O que importa é que tu tem 5 provas essa semana, e precisa estudar". 

Ganhei olheiras, que foram ficando gradativamente mais escurecidas, pela falta de sono de qualidade. Ah, eu dormi... dormi bastante. Dormi encolhida na poltrona, quando estava com dor de cabeça demais pra continuar estudando. Dormi incontáveis cochilos nos sofás do DCE, na universidade, com as luzes acesas e uma galera conversando, jogando sinuca ou tocando violão em volta. Não me admira que eu estivesse sempre com dores terríveis nas costas. Não me admira que eu vivesse com sono. Sempre exausta, sempre cansada. Meus olhos, antes tão grandes e expressivos, estavam inchados e sempre semicerrados. As dores de cabeça... essas me acompanharam por vários dias. Sem falar nas crises de rinite alérgica. 

Maquiagem? Isso existe? Eu que não ia perder 10 minutos a mais de sono pra levantar mais cedo e me maquiar. Como eu ia maquiar meus olhos, se eles mal ficavam abertos, e eu passava o dia esfregando eles? Vou te contar como eu andava me arrumando: 15 minutos antes do horário que o meu ônibus passava, eu levantava. Colocava uma roupa qualquer. Espelho? Não... não tem espelho. Eu me olhava no reflexo da tela da televisão... as vezes. Ok, tem o espelho do banheiro, só de rosto. Lá eu escovava os dentes correndo, dava uma olhada na minha cara e, no máximo, prendia o cabelo com um elástico, se estivesse muito calor, ou se o cabelo estivesse muito bagunçado. Só isso. Pegava a mochila e saía correndo. 

E essa é a minha cara de "felicidade", na ultima semana do semestre.


Mas agora estou de férias. "Ah... férias. Agora tudo será diferente!"

Como vocês sabem (eu acho), voltei pra casa, em Caxias. Fazem mais ou menos 3 semanas que estou de férias. E, cara... como é estranho ter tempo pro ócio! Como é estranho ter tempo pra futilidade! Como é estranho ter tempo pra... cuidar de mim. Eu ainda sei fazer isso? Ainda sei cuidar de mim?
Me "aventurei" nas minhas maquiagens. Redescobri elas. Na verdade, estou redescobrindo aos poucos. Nessas semanas que estou de férias, eu já cortei mais um pedaço do meu cabelo. E pintei. E retoquei/matizei a mecha descolorida. Fiz pés e mãos. Esmaltes? Meu deus, eu tenho uma caixa de esmaltes! Quando foi a ultima fez que eu fiz as unhas? E as sobrancelhas? E o buço? Fiquei apavorada. Vi outro rosto no espelho diante de mim... um rosto com o qual eu não estava mais acostumada, do qual eu havia me esquecido.


Saí sozinha, fui no cinema, comprei livros, e li pelo simples prazer de ler... sem nenhuma obrigação. Assisti séries, temporadas em sequência... sem me sentir culpada porque eu deveria estar fazendo alguma outra coisa em vez disso. Dei uma volta, comprei batons novos! E umas roupinhas! Fui no oftalmologista, e descobri que minha miopia aumentou 1 grau. Fui fazer lentes novas pros meus óculos, inclusive pros óculos escuros. Encontrei amigas! Saí! Fui a um show, fui pra pizzaria, pro xis... não pela comida, mas pela companhia. Pelas horas de conversa cara a cara. Pelas histórias. Pelas risadas. A quanto tempo eu não fazia isso? Quando foi a ultima vez que eu saí?

Esvaziei meu guarda-roupas, e enchi três sacos ENORMES de roupas pra doação. Roupas que eu simplesmente não usava mais, ou que ficaram pequenas, ou que eu tinha guardadas desde os meus 14 anos pelo simples apego. Ainda preciso fazer o mesmo com os calçados. Acho que foi uma espécie de "preparação"... uma hora eu vou ter que mexer nas coisas da mãe. E separar. E ver com o que eu quero ficar. E levar o restante pra doação. Ainda não me sinto preparada pra isso... mas uma hora eu vou fazer. E vai ser antes de as férias terminarem.


Estou sem perspectivas pra 2016. Eu sei que vou voltar pra Porto Alegre. Eu sei que vou voltar pra UFCSPA. Eu sei que vou voltar pra rotina trabalhosa e cansativa. Só não posso deixar ela me engolir. Nem quero voltar a me anular. 
Preciso arrumar uma maneira. Preciso de mais dinheiro. Preciso dar um jeito de morar em outro lugar. De ter um pouco mais de liberdade. De privacidade. Preciso ter a liberdade de deixar uma baguncinha pra lá quando não estiver afim de arrumar. De almoçar fora quando não estiver com saco de cozinhar as 10hs da noite, pra levar marmita no dia seguinte. 
Preciso ter um tempo pra mim e FOR THE LOVE OF GOD....... preciso levantar essa bunda gorda e por ela pra fazer exercícios. Lembra do prazer que era aquela bomba de endorfina depois de uma aula de spinning, Valeska? Lembra como aquilo era gostoso? A quanto tempo tu não sente isso? Não tá legal esse sedentarismo. Não tá legal essa rotina, em que o ponto alto do dia é se encostar num sofá qualquer pra conseguir dar um cochilo. Não tá legal. Quero voltar pra universidade. sim. Mas não quero voltar pra essa rotina na qual não existe EU.

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

O dia em que mamãe virou uma estrela

Não sei como começar a escrever esse post. Venho enrolando e evitando e procrastinando, deixando pra depois, esperando o meu coração se acalmar. Mas hoje, eu estou reflexiva. Hoje eu li o livro da Ana, e ele me fez refletir sobre muita coisa, sobre a minha vida, a minha família, sobre coisas de anos atrás, coisas que passaram e não voltam mais, mas que estão vivas na minha memória como se fossem hoje. O livro da Ana me ajudou a trazer essas memórias de volta pra superfície, e acho que agora é a hora de escrever.

Minha mãe é um ser humano especial. Iluminado. Saiu da cidade do interior em que morava, buscando alguma perspectiva em Porto Alegre. Tinha dois empregos, estudava à noite, e batalhava pra ter a vida que queria. Morava em um pensionato, e um dia, teve todos os seus pertences roubados. Ela conheceu meu pai, eles dividiram apartamento, ela engravidou, eles casaram, meu irmão nasceu. E um tempo depois, eles se mudaram pra Caxias do Sul, onde, 9 anos depois, eu nasci.

Minha mãe abdicou dos empregos, abdicou do estudo e possivelmente de uma universidade, pra se dedicar à mim e ao meu irmão, enquanto meu pai trabalhava feito um louco pra sustentar a todos nós. Ela fazia tudo com carinho. Não sei se eu seria capaz de fazer o mesmo. Mas o fato é que, durante toda a minha infância, sempre que eu precisei, ela estava ali. Nós fomos amigas, fomos companheiras. Passamos por muita coisa juntas, como cúmplices. Passávamos madrugadas jogando canastra. Madrugadas fazendo docinhos e salgadinhos para as festas de aniversário. 

Ela se envolveu tanto na escola em que eu estudava, que passou a fazer parte dela. Organizou um mutirão de pais para fazer a pintura da escola, durante as férias, e eu ia junto pintar as grades e paredes. Organizou festas, sorteios, rifas, fez todas as campanhas que pode para arrecadar brindes e conseguir verba para melhorar a escola, melhorar aquele ambiente que ajudaria a me construir como cidadã. Até cozinheira da escola ela foi, em um tempo que a merendeira estava de licença. Pegou tanto gosto pela coisa, que resolveu voltar a estudar, e fazer magistério. E lecionar, nessa mesma escola.

A mãe sempre teve esse dom de fazer as coisas acontecerem, de dar um jeito pra que tudo funcionasse, pra que os problemas fossem resolvidos. Sempre com um sorriso no rosto. Ela sempre tinha a solução pra tudo. Ela foi o refúgio de muita gente, gente que eu nem sequer conheço, mas que guarda um carinho imenso por ela.

De uns tempos pra cá, a mãe estava doente. Ela não ficou doente do nada, foi uma condição progressiva, desencadeada por anos de tabagismo, má alimentação e falta de atividade física. Não era a própria saúde que ela priorizava na vida. Ela priorizava os outros, nós, em vez de ela mesma. Por conta disso, acabou num quadro de diabetes, hipertensão e obesidade, com entupimento de coronárias. Se obrigou a parar de fumar, por ordens médicas, e a princípio, estava se tratando apenas com medicamentos. Mais adiante, precisou insulina e stents no coração. 

Veio um tempo em que o mínimo esforço físico a deixava exausta, a visão estava comprometida, e ela sentia muita dor. Os médicos recomendaram que ela, além de tomar os medicamentos, perder peso e cuidar da alimentação, fizesse uma cirurgia de pontes de safena, que serve para revascularizar o miocárdio, criar um caminho alternativo para que o sangue possa fluir e nutrir os tecidos do coração. E a decisão foi tomada, ela faria a cirurgia.

Entrou na fila do SUS, onde esperou meses até que conseguisse realizar o procedimento. Nesse meio tempo, eu saí de casa, e toda a história da federal que você já sabe. Ficaram só ela e o meu pai aqui. E o pai cuidou dela como ninguém, apesar das constantes reclamações dela. Isso porque ele a acordava para que tomasse a medicação no horário correto, comprava comidas "sem gosto", que ela poderia comer, e vivia superprotetor e preocupado com a saúde dela, mais do que ela mesma.

Ela transmitia segurança, paz e tranquilidade sobre o seu estado. Sabíamos que aquilo estava acabando com ela, o excesso de medicação, a dificuldade para enxergar, o constante cansaço, as picadas na barriga antes das refeições... eu via que ela estava cada vez mais apagadinha, mas toda vez que eu voltava pra casa, ela sorria um sorriso lindo, apesar do olhinho triste, e me abraçava como só ela sabia fazer.

O dia da cirurgia finalmente chegou, e estávamos cheios de esperanças de que agora ela voltaria a ter uma vida digna, conseguiria fazer atividade física, o coração voltaria a funcionar como deve, ela seria ativa de novo. Conseguiria sair de casa sem medo de passar mal na rua. Conseguiria fazer as coisas que sempre gostou de fazer, e não conseguia mais. Ela foi internada na quinta-feira, e nesse mesmo dia eu cheguei em Caxias e fui imediatamente para o hospital para vê-la. E vejam vocês, eu esqueci do documento em casa, e não me deixaram passar da recepção do hospital. Eu não via minha mãe havia quase um mês. Fiquei frustrada, não daria tempo de voltar pra casa, buscar o documento e então retornar ao hospital, os horários de visita já teriam encerrado. Engoli a frustração, fui pra casa, e telefonei pra ela. Disse que tinha ido até lá, e não tinham me deixado vê-la. Ela já sabia, claro, afinal meu pai e irmão (com seus respectivos documentos) subiram até o quarto, conversaram com ela, e falaram que eu estava lá embaixo na recepção, e que não me deixaram subir. 

A cirurgia seria só no dia seguinte, à tarde, então eu fui pra casa, tomei um banho e dormi, e assim que amanheceu, peguei meu documento e fui pro hospital com meu irmão pra ficar com ela. O pai já estava lá. 

Ela estava tranquila, conversando conosco, falando besteira e rindo como sempre. Fazendo piada com a enfermeira. Me contou que no dia anterior, quando a enfermeira a levou na cadeira de rodas para fazer alguns exames, correu com ela pelo corredor do hospital, que estava vazio, e que ela tinha achado aquilo muito divertido. Conversamos, esperamos, ela deitou com a cabeça para o lado dos pés da cama, entediada, não queria mais esperar. Perguntava porque não vinham buscar ela logo, levar para o bloco de uma vez. Até que ela pegou no sono. Esperamos. Até que uma outra enfermeira veio buscá-la. 

Acompanhamos elas até a entrada do bloco cirúrgico, meu irmão foi dar um beijo nela e desejar boa sorte. Na porta, eu estava logo atrás dela, então ela disse: "E a Eka, não vai vir me dar um beijo?" - Bem eu estava logo atrás dela, indo fazer isso mesmo, respondi: "Tô aqui!", e dei um beijo na cabeça dela. Ela foi levada pra dentro do bloco cirúrgico, e nós nos sentamos nas cadeiras, no corredor, esperando.

A cirurgia durou o que, 4? 5? 6 horas? Não me lembro mais. Lembro que eu estava tranquila, ia dar tudo certo, e ela ficaria bem. Estava cheia de esperanças. Estava confiante. Ela me transmitiu essa confiança. Passei o tempo todo lendo um livro aleatório na sala de espera, para me distrair. Meu pai e meu irmão não liam nada, não faziam nada, apenas esperavam. Até que os médicos passaram com ela em uma maca, em direção à UTI, e o cirurgião nos chamou para conversar conosco.

"A cirurgia ocorreu conforme o esperado", ele nos disse. "A cirurgia tem passos que devem ser seguidos em uma certa ordem, como um trem andando nos trilhos, e em nenhum momento o trem saiu fora dos trilhos, tudo ocorreu como deve ser." Essas foram as palavras dele. E continuou... "daqui pra frente, a recuperação só depende do organismo dela, o coração dela estava bem comprometido e nós fizemos tudo da melhor forma que era possível. Agora ela vai ficar assistida aqui na UTI, e quanto mais as horas forem passando, melhor será o prognóstico." - Ela ainda estava sedada, e assim permaneceria.

Pudemos vê-la na UTI. Meu pai entrou, depois eu. Meu irmão não teve coragem. Ela estava entubada, cheia de fios, e com edema generalizado. Não sei explicar o que eu senti ao vê-la naquelas condições. Não parecia a minha mãe, a mulher forte e alegre e risonha de sempre. Era um ser frágil, lutando pra sobreviver. Respirando por um tubo. Eu perguntei pra médica/enfermeira, sei lá, pra pessoa que estava cuidando dela na UTI, se iriam retirar aquele tubo dela quando ela acordasse. Aquele aparelho me assustava. Fazia o peito dela subir e descer mecanicamente, inflando como um balão. A moça disse que a ideia era essa, tirar ela do respirador assim que possível. Fiz um carinho nela e não consegui mais ficar lá dentro. 

Saindo da UTI, fomos orientados a ir pra casa. Nos passaram os horários de visita, garantiram que ela teria toda a assistência, e que entrariam em contato conosco para qualquer eventualidade. Fomos pra casa.

Só deu tempo de tomar um banho e comer alguma coisa. Ligaram do hospital, avisando que o quadro dela havia piorado, e que deveríamos ir pra lá imediatamente. Meu pai entrou em desespero, e eu tirei de dentro de mim uma força que eu não faço a minima ideia de onde veio. Disse pra ele parar de chorar, parar de ser pessimista, que ela ia ficar bem. Eu me recusava a acreditar em qualquer pensamento negativo. Eu me recusava a chorar. E fiz meu pai engolir o choro também. Liguei pro meu irmão, avisei pra ele ir pro hospital também, pegamos o carro, e não sei como é que chegamos lá. Passamos direto, fomos conduzidos por uma enfermeira que, enquanto nos levava até o local onde a mãe estava, nos atualizava da situação. A mãe teve uma sequência de paradas cardíacas, e os médicos a haviam reanimado diversas vezes. E era isso que eles estavam fazendo quando chegamos à porta da sala. Não pudemos entrar, obviamente. Eles a reanimaram inúmeras vezes, e o coração dela voltava, e parava. Voltava, e parava. Até que não voltou mais. 

Meu mundo caiu, e eu fiquei apática. Não consegui chorar, não consegui falar nada, apenas ficar ali, existindo naquele momento. Sentei no chão do corredor do hospital, encolhi as pernas e fiquei encarando os meus joelhos por não sei quanto tempo. Ouvia meu pai chorar e não sabia o que fazer. Ouvia ele telefonar desesperado para todas as pessoas que conseguiu lembrar, em busca de alguma resposta, algum suporte, não sei. Eu fiquei um bom tempo encarando os meus joelhos, até que não consegui mais ficar parada. Levantei, e comecei a andar de um lado pro outro, até o fim do corredor, e voltava, e ia de novo, e voltava, ainda sem conseguir chorar. Não sabia o que pensar, não sabia como agir, não sabia de mais nada! Eu não estava preparada para aquilo, ia dar tudo certo, não ia? A mãe ia ficar bem, não ia?

Encontrei uma porta aberta, e pedi pra enfermeira que estava lá se ela conseguia pra mim um copo d'água. Tomei. Os médicos deixaram a gente entrar na sala em que a mãe estava. Ela estava com a mesma aparência de quando eu a vi mais cedo, na UTI. Tinha permanecido sedada, até então. Dei um beijo na testa dela, fiz um carinho, e só consegui pensar: "Vai em paz, mãe... a gente vai ficar bem."

Quando eu saí de dentro do hospital, vi o céu, as estrelas, e aquele vento gelado batendo na minha cara, eu desabei. E chorei tudo que não tinha chorado até então. Eu não consegui me envolver na burocracia que veio depois disso, não consegui fazer mais nada, apenas acompanhei a minha família no processo, apática e sem ação. Lembro que fomos até uma funerária, onde eu sentei em uma poltrona distante e deixei que todos resolvessem coisas nas quais eu não queria me envolver. Depois fomos pra casa. Já era umas 2h da manhã. O pai me pediu ajuda para escolher uma roupa bonita, que ela gostasse. Abri o guarda-roupas, tirei algumas peças, combinei uma blusa, uma calça... peguei um porta-retrato com uma foto onde estávamos nós 4, pai, mãe, irmão e eu. Levei comigo no carro. Voltamos pra funerária. Voltamos pra casa. Ninguém dormiu. Ainda de madrugada, fomos até a capela onde o pessoal da funerária havia organizado o velório, e lá eu permaneci por horas. 

Durante várias horas, ficamos apenas nós naquela capela. E aí conversamos, e aí refletimos. E eu percebi que seria egoísmo demais da minha parte, querer que minha mãe continuasse viva naquele corpo doente e limitado, só pra querer ela perto de mim. Eu só queria que ela ficasse aqui comigo, se fosse pra ela estar saudável, ativa, feliz, sem dor, sem problemas. E agora ela estaria assim, estaria livre de todos aqueles problemas. E se pra isso eu tivesse que aprender a lidar com a ausência dela, era isso que eu faria. 

Eu e minha família nos unimos mais do que nunca naquele dia. Quando finalmente amanheceu, as pessoas começaram a chegar. Tanta gente, gente que eu nem conhecia. Vou colar aqui uma coisa que escrevi no meu facebook, depois que tudo acabou, sobre como eu me senti: 

"Obrigada a todas as pessoas lindas que tornaram esse dia suportável. Obrigada pelo carinho. Obrigada por fazerem cada um de nós se sentir muito amado e especial, e por ajudarem a tornar tudo lindo, dentro do possível.
Família que ri e chora unida, permanece unida! Ficaremos bem.
Eu me senti tão amada ontem gente. Tão amada! Eu vi amigas de todas as fases da minha vida, reunidas a minha volta, todas juntas ali comigo. Amigas que eu não via anos! Que saudade! No meio desse buraco de dor sem tamanho, em uma fagulha lá dentro eu me senti tão feliz por ter vocês! Me senti acolhida por cada abraço! E achei tão lindo que no meio de tantas e tantas lágrimas, no meio da exaustão de quase 40 horas sem dormir, conseguimos rir e falar besteira, como sempre fui, como era com a minha mãe. Se tem uma coisa que eu aprendi com ela nessa vida, é a levar a vida com bom humor. Mesmo quando parece impossível! É uma característica que já ouvi falarem que eu tenho, e que veio muito dela. Sempre sorridente. See the bright side. Always.
A saudade que sentimos é só mais uma prova do quanto a minha mãe foi um ser humano especial, que contagiava todas as pessoas que tiveram o prazer de conhecê-la, com palavras de carinho, com afeto. O coração físico pode até ter sido frágil, mas o espiritual era/é maravilhoso, enorme, gentil e solidário. Eu tenho muita sorte de ter convivido ao lado dela toda minha vida. Aprendi muito! Agora é hora de andar com as próprias pernas, mas eu sei que ela vai estar sempre olhando por mim. Mãe, eu ainda vou te dar muito orgulho! Te amo."


Achei irônico, vinha fazendo uns dias bem bonitos, de sol, e nesse dia choveu. Como se o céu também chorasse. Mas no fim do dia, o tempo abriu e o sol voltou. É meio poético, né? Como o mundo pode ser... é só saber observar.

Passei toda a semana seguinte em Caxias, com a minha família. Não fui pra aula. Não perdi nada importante. Mas na semana seguinte, tive que retornar pra Porto Alegre, o semestre estava no fim, e eu não podia abandonar tudo agora. E isso sem dúvida não daria orgulho nenhum pra minha mãe, que sempre se orgulhou dos meus estudos. 

Passando um mês, publiquei o seguinte:


"Mãezinha linda, hoje faz um mês que tu partiu. Hoje a saudade tá batendo ainda mais forte. Mas eu quero que tu saiba que, de todo coração, eu espero que onde quer que tu esteja, estejas feliz. E saiba que a gente te ama muito e não espera outra coisa pra ti. É difícil conviver com a tua ausência, é difícil chegar em casa e não ser recebida pelo teu abraço, pelo teu olhar carinhoso e pelo teu sorriso, que sempre irradiava tanto amor quando me via. Mas estou certa de que tu vai guiar os meus passos, e vai me contagiar com teu amor de mãe por toda minha vida. E sempre que eu der uma risada gostosa, vou lembrar da tua, e de como tu ia rir também se eu te contasse. E sempre que eu me sentir triste, vou lembrar do teu abraço, e de como ele tinha o poder de tirar todas as mágoas de dentro de mim. E sempre que eu estiver em dúvida, vou pensar no que tu me diria. E sempre que eu estiver com saudades de ti, vou pensar em ti com todo meu amor, pra que daí tu receba um pouco dessa energia positiva que vem de mim. Eu não fico triste ao lembrar de ti não, eu fico feliz por ter tido a oportunidade de conviver com uma pessoa tão incrível, por ter tantas memórias boas e alegres. Eu vou ficar cada vez mais forte, tu vai ver só. Amo tu, tá?"

Voltei pra Porto Alegre, estudei como uma monstra, vindo pra Caxias todos os fins de semana ficar com meu pai. Fui aprovada sem exame em todas as disciplinas, às custas de várias madrugadas em claro, e umas olheiras. Mas finalmente estou de férias. E voltei pra Caxias, onde ficarei até o ano letivo recomeçar, e eu conseguir pensar no que é que vou fazer. Não vou abandonar a faculdade, isso não é uma opção. Eu só preciso de mais força do que nunca pra seguir em frente. 



sábado, 25 de julho de 2015

Todo dia tem uma merda. (já dizia o Izzy...)

Olá, meus amores. Faz um bom tempo que não apareço por aqui, então esse lindo post vai ser um compilado das pequenas merdas que tem acontecido ultimamente. YAY!

Como todo mundo sabe (ou não), estive extremamente ocupada surtando e estudando feito uma doente mental para as provas finais, e esqueci que existia mundo la fora.

(material de estudo pra uma das provas, apenas)

E aí fiz todas as provas que precisava fazer.
E aí morri de ansiedade esperando liberarem as notas, pra saber se estava de férias, ou tinha pego exame.
E aí que eu fui aprovada em todas as cadeiras. Ou quase. Porque uma professora resolveu que seria maravilhosa a ideia de me fazer estudar de novo toda a matéria do semestre, pra recuperar 0,03 pontos. Sim. Ela me deixou em exame por menos de meio ponto. Isso mesmo que você leu.

Respirei fundo, engoli o choro, peguei todos os livros que podia pegar na biblioteca (embriologia clínica, histologia básica, dois atlas de lâminas histológicas, um cd de exercícios interativos e o caralho todo). 

(Tá faltando um atlas aí! Cada post it representa um capítulo que eu deveria estudar.)

Passaram-se alguns dias, estudando até minha cabeça explodir, intercalando com momentos de crise existencial. Eu podia estar de férias! Eu poderia já estar em casa, em Caxias! Em vez disso tenho que estudar tudo isso DE NOVO, porque???? Porque sou uma inútil que não conseguiu tirar fucking 0,03 pontos a mais!!!!!1 Puta que pariu!!!!!

MAS ESPEREM!!!!

Numa bela manhã de sol, a queridíssima monitora da disciplina conversou com a professora, que casualmente se deu conta de que estava equivocada em relação à minha nota. E tinha esquecido de somar uns pontos. E considerar uma determinada questão. E que, na realidade, eu não peguei PORRA DE EXAME NENHUM! E TAVA ESTUDANDO ATOA! NAS FÉRIAS! EU TAVA DE FÉRIAS! AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAH!

Eu não sabia se ria ou se chorava. Tinha vontade de xingar a professora de todos os nomes, e em seguida dar um abraço. Eu tremia. E custei a acreditar! Fui pra biblioteca devolver aquele monte de livros, voltei de mochila vazia, me sentindo livre! LIVRE! FINALMENTE! 

Saí pra beber cazamiga. E no dia seguinte, embarquei pra casa.

FREEDOM!!! FREEEEDOOOOOM!!!!

~~~~~~~ Em Caxias ~~~~~~~

Subsisti, na minha cama, assistindo séries e morgaaaaaaaaaaaaaando. Teve janta com a galera do spinning... teve janta cazamiga do ensino médio... encontrei casualmente umas colegas da ex-faculdade particular, e combinamos um rolê que acabou não saindo. Comi PRACARAAAALHO. Dormi PRACARAAAAALHO³³³³. 

Daí ok, como a boa nerd que sou, me inscrevi pra fazer um curso no período das férias, e voltei pra Porto Alegre uma semana antes por conta disso.

(Um parênteses: na viagem de volta pra POA, vim sentada ao lado de uma senhora, que passou o caminho inteiro cheirando um limão. Você não entendeu errado. Ela tirou um limão da bolsa, cravou a unha na casca pra arrancar um pedacinho, e aproximou do nariz. E repetiu o ...procedimento... diversas vezes ao longo da viagem. Me disse que o cheiro evitava enjôos. ok. O cheiro do limão impregnou o ônibus inteiro, mas tentei olhar pro lado positivo e, melhor aguentar cheiro de limão, do que a senhora vomitando do meu lado).


~~~~~~ Em Porto Alegre ~~~~~~ 

Os dias que passei em Caxias foram dias de chuvas intensas na região de Porto Alegre. Choveu forte em Caxias também, mas em Porto Alegre, e nas imediações, alagou TUDO. 
Na noite em que voltei, casualmente não chovia. Ainda. 
Cheguei em casa, cansada. Larguei minhas coisas. Desfiz as malas. E logo começou a chover outra vez. TORRENCIALMENTE.
Não demorou muito tempo, e ficamos sem energia elétrica. Usei o flash do celular como lanterna, em busca de velas. Tudo ok. Tava um frio do cacete, acendemos a lareira também. 

"Ah... pelo menos ainda tenho bateria e 3G", pensei. 
Só que a luz não voltou mais. não voltou até de manhã. Tchau, plano de dados... tchau bateria. Oi, tédio. Tudo bem. Não foi tão ruim assim.

Os dias foram passando. Continuou chovendo.
Acumularam-se QUILOS de roupa pra lavar. E a lavadora de roupas estragou. 
Bora esfregar tudo no tanque... rereeeeeeeeee rereeeeeeeeeeee.... 
Umidade no ar não deixa nada secar.


Concluí meu curso. As chuvas amenizaram... não chove a 3 dias.

Fim de semana, véspera da volta as aulas da faculdade, início do próximo semestre. (no caso, hoje).
Não tem nada em casa, preciso cozinhar pra voltar à rotina de levar a bolsa térmica com meu almoço. Primeiro, preciso ir no mercado. Mas tô com uma preguiiiiiiça!

Deixa a preguiça de lado, Valeska. Vai no mercado.

Fui.

Na volta pra casa, o que aconteceu????

Fiquei trancada pra fora. Na rua. Cheia de sacolas do mercado.

COMO ASSIM? Pois bem...

Coloquei a chave no portão, como de costume. 
Girei. 
A fechadura fez *clic*
O portão não abriu.
A chave se recusava a girar de volta. Se recusava a girar pra qualquer direção.
A chave se recusava a sair de dentro da fechadura.

EMPERROU!

FODEU.

Ninguém em casa.
Toquei o interfone de todos os vizinhos. 
Ninguém. atendeu.

Parei estranhos na rua pedindo ajuda. 
As pessoas tentaram, ninguém conseguiu fazer a chave sequer se mover.
E ADIVINHA???????

Começou a chover de novo. 

NA RUA, NA CHUVA... só falta a fazenda e a casinha de sapê.

Fiquei embaixo da pequena marquise até a chuva dar uma amenizada, separei a chave emperrada do resto do molho, deixei lá, e fui atrás de um chaveiro.

Eu fui em TRÊS CHAVEIROS DIFERENTES. Todos fechados.
Porra, é sábado, tu queria o que???

Nesse ponto eu já tava obviamente com os pés encharcados.
Um filho da puta passou voando com o carro por uma poça e me deu um banho.

Lembrando que eu fiz todos esses esquemas ainda carregando as minhas compras do supermercado pra lá e pra cá. Tava pesado aquela merda!!!!

Voltei pra frente do prédio já sem esperanças. A chave continuava lá, emperrada.
Tentei novamente o interfone. Até que um vizinho atendeu.

E desceu pra abrir o portão pra mim.

OBRIGADA, VIZINHO DO 201 CUJO NOME NÃO SEI, MAS JÁ CONSIDERO PACAS!!!!

Graças à boa ação do nobre vizinho, cá estou, dentro de casa, redigindo esse post "maravilhoso" pra vocês. Porque todo dia tem uma merda!

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Adaptação: mês 1

Hey pessoas!
A pouco mais de um mês, vocês bem sabem, minha vida virou de cabeça pra baixo.
Deu uma sacudida.
E agora, as coisas começaram a assentar. 

O que mudou?

Ora, mas que resposta óbvia, absolutamente tudo mudou!
Deixa eu contar pra vocês algumas primeiras constatações e fatos desse primeiro mês, no qual Porto Alegre me engoliu.

Fui amorosamente acolhida para morar na casa da "vó". Aspas, porque minhas avós de sangue já se foram a algum tempo, mas eu tenho uma vó postiça que está fazendo um ótimo papel de vó, me acolhendo no seu ap e tudo mais.

O ap da vó é pequenino, mas aconchegante. Tem só um quarto, que é o quarto da vó, o que faz com que meu quarto seja a sala de estar. E minha cama seja uma poltrona-cama. 
Mais ou menos assim:


O que pra mim está excelente, afinal, eu não estou nem pagando aluguel nem nada. Tenho cobertas quentinhas e um teto em cima da cabeça. Está tudo maravilhoso.
Vou ser hipócrita e dizer que não sinto falta da minha cama? Claro que não vou. Minha cama de casal, com meu colchão maravilhoso, vive no meu coração e me espera com todo seu conforto, na casa dos meus pais.

A vó, como a maioria das vós, nunca foi adepta de internet, logo, foi uma das primeiras coisas a se providenciar. Demorou um mês desde a data de contrato, até a data de instalação. Rendeu muitas, muitas, MUITAS ligações pro telemarketing da GVT, mas enfim tudo foi resolvido.

Aprendi o caminho de casa até a universidade, até 3 supermercados diferentes, até o banco. Tem absolutamente tudo perto de casa. Tem farmácia, tem bar, tem restaurante. Tem parque, tem açougue, tem lojas de roupa. Tem bazares, ópticas e relojoarias, e até funerária. O bairro tem tudo. Tudo. Tem ônibus praticamente na porta de casa. Aprendi a pegar ônibus. Me caguei pra me aventurar de ônibus sozinha da primeira vez que o fiz lá, mas já peguei tantos ônibus agora que está tudo bem. Fiz meu vale transporte estudantil pra pagar meia passagem.

Nas primeiras semanas, enquanto eu ainda não tinha o vale transporte, estava acordando um pouco mais cedo pra ir pra universidade a pé. Em um belo dia, começou a chover torrencialmente enquanto eu estava no meio do meu trajeto. O que alagou alguns trechos, e encheu outros de lama. Pra minha "sorte", eu estava usando um vestido, e calçando havaianas. Porque minhas pernas e pés ficaram cobertos de barro. Entrei na universidade, me dirigi até o banheiro, e lavei meus chinelos na pia. Com um bolo de papel molhado, dei um banho nas minhas pernas. Fiquei aparentemente limpa, e segui a vida, o resto do dia assim. Mas louca pra tomar um banho de verdade.

Ora Eka, mas se dá pra ir a pé pra universidade, porque tu não o faz sempre? Porque pega ônibus?

Dá pra ir a pé, mas não quer dizer que seja agradável. 

A caminhada de casa até a universidade dura cerca de meia hora. 
O trajeto é alvo de múltiplos assaltos, diariamente. A universidade fica em um "complexo estudantil", que abriga, além da UFCSPA, alguns prédios da UFRGS. Também abriga o hospital da Santa Casa. E é próximo ao parque da Redenção. A circulação de pessoas pela área é grande, assim como a circulação de assaltantes, prontos para ~atacar~. (Conheci várias pessoas que carregam consigo o "celular do ladrão". Se tu for assaltado, tem que ter contigo um celular "a mais", pra dar pro ladrão. Um celular extra, velho, sem chip, sem tuas informações pessoais, só pra satisfazer o ladrão, e não perder o seu celular "verdadeiro".) Só o que não há é circulação de viaturas para conter o grande numero de assaltos. Aliás, há um grande movimento estudantil que solicita maior policiamento na área. Temos um abaixo assinado, com o qual você, você mesmo, pode contribuir. Por favor, contribua. Não custa nada. Não quero ser assaltada. Obrigada.

Além de o trajeto ser perigoso, ele também fede. Sim, Porto Alegre fede. Há uma enorme quantidade de moradores de rua, dormindo em todas as calçadas ao longo do caminho. De manhã cedinho, quando saio de casa, eles ainda não acordaram. Mas a rua tem cheiro de xixi. E já me deparei com vários... vômitos, na calçada. Também tem muito lixo espalhado, e restos de comida pelo chão. Então, a caminhada não é nem segura, nem agradável. Acho que a limpeza de Caxias me deixou mal acostumada, embora na minha visão o ideal é de que todos os lugares fossem... limpos, eu sei que na maioria esmagadora dos lugares, não é assim. Ao menos pude constatar isso pelas cidades do Brasil que já tive a oportunidade de conhecer. Nenhuma é tão limpa quanto Caxias. Porto Alegre, definitivamente, não é.

Acho que Caxias me mal acostumou também com a "fartura italiana". Interior do Rio Grande do Sul tem muita agricultura. É possível comprar verduras e legumes em abundância, com uma qualidade excelente a um preço baixo, diretamente com o produtor, nas feiras do agricultor. Come-se MUITO bem na serra, meus quilinhos a mais não me deixam negar. Em Porto Alegre, é difícil encontrar bons itens de hortifruti. Os "exemplares" são definitivamente pequenos, e caros. Muitas vezes, não se encontra certas coisas, ou o estado de conservação dos vegetais é tão deplorável, a um preço tão absurdo, que simplesmente não dá pra comprar. O supermercado mais próximo passou mais de uma semana sem leite nas prateleiras. Nem sequer uma caixa. Nem ovos. As vezes também não tem pão. Talvez seja um problema de administração desse supermercado em específico... provavelmente seja. Mas a questão dos vegetais, é em todo lugar que fui.

Mas vamos falar de coisa boa. Vamos falar da universidade!!! A universidade é só amor!



As pessoas foram/são extremamente acolhedoras e simpáticas. O curso é integral, o que quer dizer que chego na universidade de manhã cedo, e saio no final da tarde. O que quer dizer que passo praticamente todos os meus dias inteiros com as mesmas pessoas, que vim a conhecer muito rápido, e que criamos um vínculo por isso. Todos nós estamos lá, "sofrendo" as mesmas coisas, submetidos à mesma carga IMENSA de conteúdo pra estudar, trabalhos pra fazer, e tudo mais. Isso, de certa forma, nos uni. Temos veteranos que, um ano atrás estavam vivenciando exatamente a mesma coisa que nós, e se disponibilizam a ajudar. e doar materiais, e orientar, e a serem as pessoas mais receptivas do lugar. 
Um ANO, sim, não semestre. A universidade tem matrículas anuais. Cada ano é uma "série", e cada série tem o seu grupamento de disciplinas correspondentes. A gente não escolhe em quais disciplinas quer se matricular. A gente é automaticamente matriculado na série correspondente. O que quer dizer que somos automaticamente matriculados em todas as disciplinas correspondentes àquela determinada série. O que quer dizer, nesse primeiro período, 12 disciplinas. Sim. DOZE DISCIPLINAS. Não temos escolha. São 12, ou nada.

Sabe quantas disciplinas eu cursava na FSG? Três. Quatro, quando o dinheiro dava. E eu trabalhava feito um cão pra dar conta de pagar por essas disciplinas, correspondentes a 3 manhãs de aula, que consumiam o meu salário. Vocês já estão cansados de saber.

Sabe quanto eu estou gastando agora, pra cursar 12 disciplinas, correspondentes a 5 dias de aula, período integral...? Absolutamente nada! :) 

Também não estou trabalhando mais. Ou não voltei a trabalhar ainda, como preferir. Porém, a universidade oferece assistência estudantil, uma ajuda de custo para estudantes que não tem renda pra se manter, não deixarem de estudar por isso. Ou seja, a gente além de não pagar pra estudar, recebe pra isso. A universidade também disponibiliza bolsas, diversas bolsas, também remuneradas, pra estudantes que quiserem fazer algum trabalho extra dentro de programas da própria instituição.

Quanto à estrutura física da universidade, não tenho do que me queixar. 
Aliás, tenho sim, nós não temos RU. A falta de um restaurante universitário pra alunos que, como eu, passam manhã e tarde na universidade e precisam almoçar em algum lugar por lá é uma questão a ser discutida à parte. Não temos RU, mas dizem que... a construção de um está nos planos da reitoria. Planos esses que não serão realizados tão em breve assim, porque houve um corte do governo na verba destinada à educação. Mas ok, a FSG também não tinha RU.
A alternativa que os estudantes encontraram pra isso, foi a aquisição de microondas para o espaço coletivo que temos junto ao DCE. Muita gente, eu inclusive, adquiriu bolsinhas térmicas para transportar seu próprio almoço, esquentar nos microondas, e almoçar por lá mesmo, no espaço coletivo. Espaço esse que aliás é bem acolhedor, temos sofás, 2 violões, 2 mesas de sinuca, e 2 mesas pra comer. O lugar pra sentar em uma das mesas e almoçar é concorrido, mas dá-se um jeito, ninguém deixa de almoçar por isso.
Quanto ao reeeeeesto da estrutura física, eu não tenho do que me queixar. 
Temos catracas com identificação biométrica para conseguir acessar os prédios, o que quer dizer que, apesar da zona ser perigosa, lá dentro é seguro. Temos elevadores que falam. Temos DOIS ar-condicionados na sala, que nem é tão grande assim. Não sei vocês, mas nenhuma das particulares em que estudei (ucs e fsg) tinham isso.
 Temos constantes reformas, banheiros novos estão sendo construídos. Temos laboratórios super bem equipados em cada uma das suas especificidades. Temos uma biblioteca voltada exclusivamente para cursos da área da saúde (obviamente, afinal esse é o foco da universidade). 
Temos professores excelentes. Temos um nível de cobrança fora do comum. Temos que atingir média 7, no mínimo, se quisermos ser aprovados. E não é fácil, cara. Não é fácil. Os professores querem que tu saiba o que tu tem que saber, e não estão nem aí se tiverem que te rodar pra isso. 
Aliás, a forma que eles querem que tu estude também é diferente da particular, na minha concepção. Na FSG, eu só estudava pras provas pelos slides dos professores, praticamente. As vezes o google dava uma ajuda. E ia super bem em tudo. Na UFCSPA, os professores querem te fazer pesquisar e engolir os livros da biblioteca. Vai estudar. Vai procurar a informação. Te vira. Cada um se entende melhor com a explicação de um autor, então tu tem que ler vários, procurar, se adaptar, construir o teu próprio conceito, em vez de pegar ele pronto no slide.

Os colegas também são diferentes, em termos de participação. Não sei porque motivo, não sei se é questão de cultura local, não sei explicar porque. Na federal, os alunos são mais participativos. Muitas vezes, na particular, o professor ficava num vácuo, num monólogo constante a aula inteira. Ninguém questionava. E quando o professor fazia uma pergunta qualquer, ninguém se manifestava. Em diversas situações, eu era a única que me manifestava, ou questionava algo. 
Os colegas da federal questionam. Debatem. Dão opinião, e se interessam pelas opiniões diversas. As pessoas por lá tem a cabeça mais aberta. Ninguém se importa se tu vai pra aula com qualquer roupa que estiver afim, de chinelo, ou bem arrumada. Ninguém se importa. Ninguém se importa se tu vai pra aula de ônibus, a pé, de carro, ou de bicicleta. As pessoas, aliás, usam muito a bicicleta como meio de transporte. Vá como quiser. Vá como preferir. Acho que isso é uma coisa da cidade em si. 

Em Porto Alegre tu encontra gente de todo tipo. Meninas "menininhas", meninas de cabeça raspada, meninas que não querem se depilar. Gente maquiada, gente de cara lavada. Caras com barba, sem barba, de cabelo curto, comprido, com dread. Tem gente com todos os tipos de roupas, das mais comuns e arrumadinhas, às mais hippongas. Ninguém se importa com isso, ninguém repara no seu jeito, no jeito que você se sente confortável sendo. Ninguém se importa se tu quer ficar com um cara, com uma guria, ou com os dois. Ninguém se importa se tu é gordo ou magro. Ninguém se importa. Seja você, seja como és, e seja feliz assim. O mundo está ok com isso. Todos estão ok com isso, e ninguém fica reparando em você, ou te olhando diferente por isso. A diversidade está aí pra ser vivida e amada.

Em Caxias todo mundo é igual, todo mundo "tem que" ser igual. As pessoas reparam na sua roupa, no seu cabelo, no seu estilo de vida. Em Caxias, se tu tem cabelo diferente, só pode ser lésbica. Se tu usa uma roupa diferente do que todo mundo usa, CREEEEDO! Em Caxias, DEUZOLIVRE tu ir pra universidade calçando havaianas. Em Caxias DEUZOLIVRE tu ir pra faculdade de bicicleta. Na terra da polenta, todos tem que usar sapatos bonitinhos, e ir pra aula de carro. No máximo pegar um ônibus. Caxias é uma cidade... quadrada. E se você não se encaixa no quadrado, ache um jeito de se disfarçar.

Enfim, pessoas. Já escrevi tantas coisas que nem sei mais. Meu período de adaptação tem sido ok. Estou definitivamente feliz com a mudança de vida, e com o crescimento pessoal que isso tem me proporcionado. Ainda tenho MUITO dessa cidade pra descobrir. A começar pelos nomes das ruas, as pessoas me contam onde moram AND I HAVE NO FUCKING CLUE WHERE THE HELL IT IS! (eu me expresso em inglês quando fico meio puta da cara... desconsidere). Também ainda tenho muito a aprender no quesito frugalidade. Preciso aprender a gastar dinheiro com o que é essencial. E fazer o dinheiro dar pra tudo. Não tem mais papai pra fazer as compras do supermercado pra mim. Não tem mais mamãe pra arrumar minha cama, mesmo eu falando que não precisa. Já tava na hora, né?

Vou ficando por aqui, mas indico outro texto que tem TUDOAVER, e que tive o prazer de ler por esses dias, e que... tem tudoaver. É pra clicar, tá? É preciso ir embora!

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Absorvendo mudanças a doses homeopáticas

A vida. A vida tem dessas coisas mesmo. Um dia a gente reclama da rotina, reclama da falta de grana, reclama que ela não muda. Que ela parece que parou, sentou-se confortavelmente e lá permaneceu. Na zona de conforto. E se a zona de conforto não fosse de fato confortável, assim ela não se chamaria. A zona de conforto é o arroz branco, o pão com manteiga, é aquilo que não é a melhor opção do mundo, mas é gostoso, é ok, é uma escolha segura. Só que um dia você tem vontade de provar comidas que nunca comeu antes. E no caso de mudanças na vida, isso significa abandonar o pão com manteiga. E se o novo sabor não for tão "de casa" quanto? Mas ele parece tão atrativo... tão cheiroso...

Essa analogia com comida tá estranha. Acho que estou com fome...

2015 tinha tudo pra ser um ano "pão com manteiga". Assim foi 2014, e tinha tudo, absolutamente, para continuar assim. Eu mesma não esperava grandes mudanças. Não senti diferença nenhuma quando o ano virou, continuei na minha casa, na minha cama, fazendo as mesmas coisas, indo pros mesmos lugares, reclamando dos mesmos problemas. De 31/12 a 01/01, não houve nem cocegas.

Acho que a ultima grande mudança que ocorreu na minha vida foi em 2013, quando eu fiz as contas e percebi que conseguiria converter o meu salário em uma mensalidade do semestre da faculdade de fisioterapia. Segurem esse pensamento. 

Esse blog existe desde a época que eu saí do ensino médio, e meio que acompanhou todo o processo de tentativas e fracassos da minha vida acadêmica até então praticamente nula. Períodos de letargia, ingresso em curso aleatório só pra me sentir parte de algo (eu estudei publicidade e propaganda um tempo, alguém aqui lembra disso?), mais um pouco de letargia. E nesse meio tempo eu aprendi inglês. E depois de um tempo comecei a dar aulas de inglês. E enquanto isso eu fiz alguns vestibulares em vão, sem grandes esforços, novamente, pra me sentir parte de algo. Eu fiz enem não uma nem duas, mas quatro ou cinco vezes. Eu me inscrevi e não fui fazer a prova um ano desses. Eu dizia pra mim mesma que eu estava tentando. Eu fiz um ano de curso pré vestibular. Eu fui pra Campinas. Eu tentei conseguir uma vaga na Unicamp, pra fonoaudiologia, curso pelo qual eu novamente não demonstrava grandes paixões, mas queria me sentir parte de algo. Também não aconteceu. Eu tentei usar a nota de um desses enem(s) aí que eu fiz ao longo desses anos, pra entrar em uma universidade pública. Não consegui. Parecia que eu não estava me esforçando o suficiente. Parecia que por mais que eu dissesse pra mim mesma que estava me esforçando, não era suficiente.

Um belo dia eu peguei aquela matrícula da publicidade, trancada a anos, e resolvi transferi-la para outra faculdade, para outro curso, a fisioterapia. E esse foi o último "big step" que eu dei. E foi um passo grande e certeiro. Me apaixonei pelos conteúdos estudados, me apaixonei pelos professores, voltei a sentir sede pelo conhecimento, e fiz amizades que vou levar pro resto da vida. Aprendi coisas que jamais imaginei que um dia eu saberia. Voltei a me sentir desafiada, voltei a me sentir inteligente. Acordei da letargia. As pessoas me admiravam, me diziam que eu era inteligente. Tudo estava lindo. 
Na vida, uma coisa leva a outra, ela não para. Por mais que a gente tente se sentar e descansar confortavelmente na nossa zona, por um tempo, quando as coisas parecem ter alcançado um patamar agradável, a vida não nos deixa parar ali por muito tempo não. Ela vem e cutuca a gente avisando que é hora de levantar, que é hora de dar mais um passo.

Os semestres foram passando, as amizades se consolidando, a rotina se estabelecendo, e os reajustes de mensalidade sendo feitos, semestre após semestre. Até que em um dado momento, eu percebi que se a correnteza continuasse seguindo esse mesmo fluxo, em um futuro muitíssimo próximo o meu salário não seria mais suficiente para ser convertido em uma mensalidade do semestre do curso de fisioterapia. E eu ainda estava tão loooonge de me formar! 
Comecei a cogitar alternativas: eu poderia arrumar um emprego dentro da faculdade, o que me daria desconto na mensalidade. Mas pra isso eu teria que sair do meu emprego atual, deixar os meus alunos que gosto tanto! Ou eu poderia parar de estudar por um tempo e juntar uma pequena poupança. Essa alternativa pareceu pouco esperta, os reajustes ainda viriam, eu estudando por aquele período ou não. E pararia de saciar minha sede por conhecimento. Não parece uma boa opção. A alternativa perfeita seria uma bolsa de estudos, mas como conseguir? A única forma que a instituição disponibilizava, era através do Prouni. E pra isso eu teria que fazer o enem outra vez. Outra vez. Mas eu estava ficando sem alternativas, então... porque não? Porque eu não consegui uma vez? Ou duas? Ou três? Mas eu me sentia tão mais inteligente agora! Meu copinho de conhecimento estava meio cheio, não mais meio vazio. Me inscrevi e fiz a prova outra vez.

E aí os meses passaram, e a vida seguiu sua rotina. Vocês sabem como essas coisas funcionam, a nota demora meses pra sair. Quando o resultado finalmente saiu, a minha média ficou acima da média nacional. (sempre é, mas nunca pareceu o suficiente). Eu resolvi que já que tinha feito a prova de novo, eu ia tentar fazer absolutamente tudo que fosse alternativa com essa nota. Ela era a minha única saída. Não só tentaria conseguir uma bolsa de estudos integral pelo Prouni na faculdade particular em que me encontrava, como também faria inscrição no Sisu, que é um programa que disponibiliza algumas vagas em universidades públicas, classificando os candidatos inscritos pela nota obtida no enem.

Me inscrevi no Sisu, e joguei os dados. Fiz as minhas apostas mais altas: UFCSPA (Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre), que recentemente foi avaliada como possuidora do melhor curso de fisioterapia do Brasil, e UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) também em Porto Alegre, que é o sonho de consumo de todo bom estudante gaúcho. Não custa tentar, né? Porque não?

Fiquei acompanhando as notas de corte diariamente, quando eram atualizadas. A minha média estava acima da nota de corte. De ambas as universidades. Eu não conseguia acreditar no que os meus olhos estavam vendo, mas resolvi não colocar muita expectativa, mais pessoas poderiam se inscrever ainda. Mais pessoas com médias melhores, que poderiam jogar a minha para uma posição mais abaixo. No penúltimo dia de inscrições, eu ainda estava dentro. E quando as inscrições terminaram e eu achei que finamente saberia o resultado final... ele só seria divulgado dali uma semana.

Passei essa semana tendo pequenos ataques de pânico. Nessa mesma semana, reencontrei amigos queridos da faculdade. E fomos pra Porto Alegre no show do Foo Fighters. Eu tava com um pressentimento bom, de que aquela cidade me traria coisas boas. A cidade já estava me fazendo feliz, com aquele show. Cês leram o post que vem antes desse, não leram? Então, foi um dia surreal. E depois disso eu continuei esperando. Achei que até o prazo final com certeza mais alguém se inscreveria. Com certeza eu cairia pra lista de espera. Mas VAI QUE alguém desiste da vaga, e me chamam à partir dessa lista, né? Vai que... eu tinha um fiozinho de esperança.

Hoje, eu recebi um e-mail com a seguinte mensagem:


QUÊ?

Fui conferir o meu boletim e... 



Eu fui aprovada na primeira chamada. Na UFCSPA. No melhor curso de fisioterapia do país.
Eu vou estudar de graça! Eu não vou mais ter que converter meu salário em mensalidades!
Eu também não vou mais ter um salário, porque vou ter que deixar meu emprego. E minha atual faculdade. E meus amigos. E minha casa. Vou deixar essa cidade pra trás. E ser chutada sem cerimônia alguma, pra fora e bem pra longe da minha atual zona de conforto. Chegou o momento do próximo "big step" dessa velha resmungona chamada vida, ela, que não nos deixa ficar parados. Deu pra ti, baixo astral. Vou pra Porto Alegre, tchau!

Eu ainda não absorvi totalmente a mudança. Estou absorvendo aos poucos, a doses homeopáticas. E tentando não ter um ataque de pânico, nem me sentir desnuda e vulnerável. O prazo para a matrícula é curto, então imediatamente (assim que consegui parar de tremer e chorar e olhar fixamente para o meu nome na lista de aprovados) comecei a reunir a documentação necessária para a matrícula. Fui até a minha atual faculdade cortar o vínculo, cortar o cordão. Fui até o meu trabalho conversar com o meu chefe sobre a minha eventual mudança de cidade e incapacidade de continuar trabalhando ali. Fui tirar fotos 3x4 atualizadas. Desencavei o meu histórico escolar do ensino médio, para comprovar o fato de ter estudado sempre em escolas públicas. Recebi tantas, incontáveis mensagens de apoio, e abraços, e comentários, e ouvi muitas outras pessoas me fazendo perguntas que eu não sabia responder. Que eu ainda não sei responder. 

Onde tu vai morar? Com quem tu vai morar? Como tu vai se lovomover? E de noite, não é perigoso? Que turno tu vai estudar? Integral? Como tu vai trabalhar então? Como tu vai se sustentar?

Eu não sei. Eu ainda não sei de nada. Absolutamente. Cortei vínculos imediatamente com as pendências que tenho nessa cidade, de forma rápida e indolor, como quando se arranca um bandaid. Tudo de uma vez pra doer menos. Rápido, pra não dar tempo pra pensar em mais nada. Pra não dar tempo de desistir.

A única coisa que eu sei é que quando a vida te dá a oportunidade de estudar o curso que tu quer estudar, de graça, na melhor instituição do país, tu simplesmente vai. O resto depois se dá um jeito. Certas coisas, não se pode recusar. De certas coisas não se pode recuar.


ESSE POST do fim de 2014 é a prova do quanto eu estava insatisfeita, e precisando virar o jogo. Aí está, como eu mencionei que aconteceria... "uma hora o jogo vira"... pois bem, VIROU!

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Foo Fighters South Ametica Tour - Sonic Highways - Porto Alegre - 21/01/2015 - EU FUI, CARALHOOOO!!!

MELHOR

SHOW

DA

MINHA

VIDA!

Isso resume.

Os ingressos já estavam comprados à cerca de 4 meses. Comprei o e-ticket online, aquele que tu imprime em casa. Perto do dia do show, fui imprimir meu lindo ingressinho e, como todos já deveriam saber, impressoras tem vida própria, e são muito temperamentais, de lua, e filhas da puta. Funcionam se querem, quando querem, Na maioria das vezes simplesmente te ignoram, ou gritam te avisando que não tem papel, que não tem cartucho, sendo que tá tudo devidamente abastecido. Juro procês, passei mais de meia hora tentando fazer aquela bosta funcionar até que:


Consegui imprimir meu ingresso!!!

Várias expectativas e ansiedade pré show, vazaram na internet possíveis setlists, baseadas no que a banda tinha tocado nos shows da Argentina e Chile. Montei minha playlist baseada nas coisas que vazaram e ouvi incansavelmente até o dia do show!!!


No meu twitter não se falava em outra coisa!!! Depois o assunto se dividiu entre show e Sisu. E depois conto a história do sisu, estou esperando desenrolar... mas eu passei dias RESPIRANDO Foo Fighters!!!!

Na véspera do show, eu não conseguia dormir de ansiedade!!! 
Expectativa pelo show, somada ao resultado do Sisu e imaginando possibilidades de me mudar pra Porto Alegre pra estudar, ainda esse ano. Coloquei os fones de ouvido e mais uma vez, fiquei viajando ao som de Foo Fighters, deitada na minha cama, no escuro, quando deveria estar dormindo. Peguei meu celular e comecei a twittar insanamente por volta das 4 da manhã. Em algum momento eu devo ter pegado no sono.

Quando acordei, peguei o celular de novo pra ver que horas eram e se eu não estava atrasada, mas meu celular não ligou. Como assim não ligou??? Eu acabei de tirar ele do carregador! Não sei, galere!  O telefone simplesmente morreu! Não funciona mais, não liga, não pega carga, não dá sinal de vida nem tentando acessar o modo recovery! Nada! Aquele celular que eu ganhei de um amigo... morreu!!!!! Como assim, cara???? Como é que eu vou ler meu whatsapp??? Como é que eu vou combinar com a galere os esquemas do show??? Como é que eu vou pro show sem telefone???? NOOOOOOOOOOOOOOOOOOO!!!!

Mãe, me salva!!! Me empresta o telefone que eu te dei (que era o meu antigo)!!!! PLEEAAASEEE!!!
Mãe é mãe, né! Emprestou. Catei o celular e, porra, eu não tenho o numero de mais ninguém, e cortei meu chip, não cabe mais nesse telefone. E agora???? Facebook, me salve!!!! "Pessoas, me passem seus números de novo!!!!" ok. Consegui me comunicar com a galere com quem eu ia pro show. NADA VAI ESTRAGAR MEU DIA!!!!! NEM A MORTE DO CELULAR! NEM A PERDA DE TUDO QUE TINHA NELE!!!

Devo ter dormido umas 3 horas no máximo, ao longo da noite. Fiquei com uma puta dor de cabeça fodida, mas NADA VAI ESTRAGAR MEU DIA!!! Manda um cefalium pra dentro e BORA PEGAR AS COISAS E SE ARRUMAR E PARTIU PORTO ALEGRE!!! 
Tudo na mão, encontrei a galere e fomos!

Chegamos em Porto Alegre por volta das 3:30 da tarde, encontramos um lugar pra guardar o carro e nos encaminhamos pra FIERGS! A fila tava gigante, mas tava organizada. Esperamos um tempão, mas não foi tão ruim assim! 


Selfies na fila pra entrar. DICA: não tirem fotos com a cara virada pro sol, não dá pra abrir o olho!!! Eu tentei, juro! E saí com essa cara de merda! HAUIHAUIAH


E óbvio que, devido à minha fotofobia, que não é fobia de fotos, mas sim olhos extremamente sensíveis à luz, fiquei com muito mais dor de cabeça depois. Tem uma foto em que eu apareço sentada no chão com as mãos no rosto, morrendo por dentro e torcendo pra dor passar. Mas ficou na câmera da minha amiga e, quando eu tiver o arquivo mostro pra vocês. Não que seja lá muito interessante, mas enfim... é só pra documentar o dia. MAS NADA VAI ESTRAGAR O MEU DIA!!!! VAMO LÁ, ALEGRIA! EU VOU VER FOO FIGHTERS, PORRA!!!! (mas vai embora, dor.. vai embora...)


Entramos no local do show, e nos posicionamos o mais próximo do palco que a multidão que já se encontrava la, e a nossa pista não-vip nos permitia. 


Meu ingresso dava acesso à área azul. Ficamos atrás da pista amarela, próximo ao fim da extensão do palco que dividia as duas pistas vip.

Essa era a vista do local que a gente ficou:

Parece bom, né?

O lugar estava excelente, dava pra ver tudo super bem! Enquanto todo mundo estava sentado no chão. Era umas 4 ou 5 horas da tarde. Duas bandas iam tocar antes do Foo: Comunidade Ninjutsu (desnecessário) e Kaiser Chiefs! Ficamos sentados no chão por um loooongo tempo, até começar o show do Comunidade, isso lá pelas 6 e pouco. Já tinha visto eles outras vezes, nos planetas atlântida que eu fui, e tava cagando pra apresentação. 
Quando entrou o Kaiser Chiefs, acho que lá pelas 7:30, a galera já se empolgou mais. Todo mundo de pé, e eu tive a infeliz constatação que do alto dos meus grandiosos 1 metro e 64 centímetros de altura, eu não veria muita coisa. Daí em diante eu fiquei praticamente o tempo inteiro na ponta dos pés, desviando o olhar das cabeças!

Ponto negativo de ir em shows na FIERGS: Não tem arquibancada. Devido à essa circunstância, achei o palco baixo. E os telões laterais estavam MUITO baixos também! Pra vocês terem noção, no auge do show houve momentos em que nem o telão eu conseguia ver!!!!

"AI EKA MAS QUEM MANDOU NÃO COMPRAR PISTA VIP!!!!!"

 Quem mandou nascer pobre e baixinha, né???? 

Mas então... COMEÇOU O SHOW DO FOO FIGHTERS!!!!

Nessa hora, não tinha mais dor de cabeça, não tinha mais problemas na vida, não tinha mais aflição, não tinha mais nada, só uma sensação maravilhosa! Cantei como se aquelas fossem as últimas músicas que eu ouviria na vida! Gritei como se eu não fosse mais ter voz! Pulei como se a dor nos meus pés não importasse! Levei empurrões, empurrei de volta (apenas um bêbado otário que achou que seria uma ótima ideia fazer mosh sozinho, empurrando todo mundo que tava ao redor dele. Levou umas cotoveladas de mim, e com certeza mais uns chega-pra-lá dos outros), consegui me enfiar mais pra frente e me afastar do bêbado otário, puxei papo com pessoas aleatórias que se mostraram extremamente simpáticas, fiquei com lágrimas nos olhos, e estou ainda mais apaixonada platonicamente pelo Dave Grohl!!!!

Quanto à banda, eu simplesmente não tenho do que me queixar! Começaram o show pontualmente, e tocaram tudo que eu esperava durante TRÊS HORAS DE SHOW!! 
Eles parecem (são) um bando de amigos se divertindo no palco, e tu, da platéia, se sente parte daquilo, se sente parte do grupo, como se fosse amiga deles, ali, se divertindo! O Dave... é puro carisma e simpatia, dá vontade de abraçar ele e não soltar mais! Dá vontade de sentar com ele numa mesa de bar qualquer e ficar conversando até amanhecer! Dá vontade de só agradecer por me proporcionar um dos dias mais felizes da minha vida!

Cada vez que ele pegava o microfone e começava a falar, eu ficava olhando, atônita, com lagriminhas no canto dos olhos. Depois virava prazamiga e traduzia tudo o que ele tinha acabado de dizer. Vou colocar um vídeo-exemplo aqui, do discursinho de final de show: 


Essa foi a última musica que eles tocaram, mas ao longo das 3 horas de show, tiveram vários momentos como esse, eu que tu vê que ele é um cara como a gente, um cara simplesmente foda, que eu adoraria conhecer de verdade! Em vários momentos, ele disse que aquilo tudo era incrível! E o calor da multidão de fato estava incrível! Quando terminaram de cantar Best of You, todo mundo continuou cantando a musica em coro, até que a banda ficou em silêncio só escutando a gente, e a câmera do telão focou no rosto do Dave e dava pra ver claramente que ele tava emocionado com aquilo! E passou aquela emoção pra mim, e meu deus gente, me abraça! Eu ainda tô meio em choque, ainda vejo esses vídeos tremidos que a galera postou no youtube e dá um arrepio, sabe? 

Não sei se vocês manjam "dos inglês", mas aí nesse trecho por exemplo, ele fala (em tradução completamente livre) que a platéia daqui é incrível, agradece a todos por estarem ali naquela noite, por acompanharem a banda pelos 20 anos de estrada, porque se não fossem os fãs, se não fosse por nós, eles não estariam ali hoje. Dá uma pausa pra... pensar... e diz que nunca... que não gosta de dizer adeus e que "não se preocupem, eu não vou dizer adeus ainda!" - e que ele sabe que vai nos ver de novo, porque eles vão voltar algum dia. E que ele realmente não sabia o que esperar quando chegou ali, que tava sentado nos bastidores e não sabia bem onde estava tocando, e nem sequer olhou pra fora, e aí uma pessoa que trabalhava ali falou pra ele que os ingressos estavam esgotados, tinham vendido tudo! E ele "SÉRIO?" -  "Sim, tem 37 mil pessoas lá fora" -  e ele ficou pasmo! "AH MEU DEUS, QUE LOUCURA! Eu não fazia ideia que era essa loucura! Então, obrigada a todos vocês!"

Quando o show acabou,  eu queria voltar no tempo e começar tudo de novo! Queria ficar ali pra sempre!!! Queria ter grana pra viajar e ver os outros 3 shows que eles farão no Brasil, em São Paulo, no Rio, e em Minas. Juro que se eu pudesse, se eu tivesse como, eu ia em todos, só pra sentir tudo que eu senti de novo!

Ainda estou atônita! Ainda estou sorrindo que nem idiota! Ainda estou com lágrimas nos olhos só de lembrar, só de escrever esse post! Passei ultima madrugada inteira assistindo todos os vídeos do show que encontrei no youtube, não importa se estão tremidos, não importa se o som tá ruim! Eu vi e ouvi ao vivo, eu lembro de cada palavra, e o calor daquele momento que eu vivi vai ficar dentro de mim pro resto da minha vida! Obrigada, Foo Fighters, por esse dia incrível!